Não é à toa que a depressão é o mal do século. São muitas as exigências para uma pessoa só. Seguir padrões de beleza, ser magra, andar na moda, ter cabelo bonito e bem tratado, mãos e pés impecáveis; falar e escrever português corretamente, ter fluência em inglês, procurar aprender outra língua como diferencial para seu currículo e sua carreira, ter uma profissão que lhe dê prazer e ao mesmo tempo dinheiro, conseguir seguir um plano de carreira dentro da empresa;
Estar sempre atualizada com as novas tendências tecnológicas é imprescindível, megabytes, gigabytes, MP3, MP4, iPod, celulares que já adivinham para quem você quer ligar, fones de ouvido mega potentes, TVs de ultra-mega-super-alta definição; Ter perfil no Orkut, no facebook, no twitter e por lá, seguir uma infinidade de pessoas que jorram informações a 140 caracteres a todo o momento; estar antenada com as noticias não só do Brasil, mas também do resto do mundo, inclusive das micro ilhas da Indonésia, entender o tipo de economia vigente lá e o sistema político adotado, afinal, o mundo é globalizado e qualquer passo em falso lá do outro lado do mundo pode acarretar um tsunami econômico aqui na tropicálha.
Ter um relacionamento feliz e duradouro com um homem que atenda todos os pré-requisitos para lhe fazer feliz – ou seja, um homem com pouquíssimos defeitos -, estar casada com ele antes dos 30 anos, ter filhos até os 35 e ainda continuar bonita e sensual, pois você corre o risco de ser trocada por outra mulher que é tudo isso e muito mais;
É imprescindível que o seu apartamento atenda o design da ultima moda e te defina como pessoa, e que ele esteja sempre limpo e impecável para receber suas amigas, casadas ou não, mas todas pós-graduadas como você, que já passou por trabalhos de conclusão de curso, bancadas com professores mal-humorados cheios de perguntas irrelevantes, muitas vezes considerados profissionais frustrados e cheios de não me toques, neste caso, o jogo de cintura é uma arte que não pode faltar no seu currículo;
Mas, nada disso importa, pois você na poderá deixar de assistir a todos os ultra-mega-advanced espetáculos do Teatro Abril, aos shows do U2 e do Roger Waters, que sempre chegam com a ameaça de ser a ultima passagem deles aqui no Brasil, assim como os filmes da Mostra Internacional de Cinema que só passam uma vez e nunca entrarão no circuito dos grandes cinemas, e você, ainda bem, conseguiu ver aquele do diretor consagrado do Irã que todos acharam fantástico;
E... claro! Não podíamos esquecer que você também tem que, ates dos 50 anos, ter conhecido a Europa, alguns países essenciais da America Latina, como Chile e Argentina, e a ultima tendência da área do turismo, Dubai; e nada melhor do que levar na bagagem, tanto de mão quanto intelectual o entendimento de assuntos, principalmente os literários. Para isso, é preciso que voc~e tenha lido, pelo menos, um livro do Saramago, um do Luis Fernando Veríssimo, uns dois de Dostoievsky – afinal de contas é preciso saber comparar uma obra da outra -, um do português Eça de Queirós, uns quatro do baiano Jorge Amado, pelo menos um do colombiano Gabriel Garcia Marques e um do espanhol Miguel de Cervantes.
É necessário também ter lido e saber citar poesias de Manuel Bandeira, Cecilia Meireles e Fernando Pessoa, saber sobre cinema e os filmes considerados ou rotulados “de autor” e assim ter visto, pelo menos, um filme do Felini, do Kubrick, do Lars Von Trier, do Spilberg, do Kurosawa e do louquíssimo Buñuel, ter ido a todas as super-ultra-mega exposições da Oca, no Parque do Ibirapuera e, para finalizar, não esquecer de se atualizar sempre sobre os últimos campeões do campeonato Paulista, Brasileiro e Libertadores. Afinal, somos o país do futebol.
E tudo isso procurando sempre manter a sua autenticidade e personalidade intactas, seguindo os preceitos do bem e não fazendo mal a ninguém, porque aqui se faz, aqui se paga.
Retirado da revista off Line Nº 15
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Texto de Taís Kerche
Tais.kerche@gmail.com